Artigo de opinião do professor Luís Blak: ASSÉDIO SEXUAL NA SOCIEDADE DA GUINÉ-BISSAU

Temos acompanhado com alguma preocupação a antiga/nova versão da sociedade da Guiné-Bissau, isto é, o papel da mulher nesta sociedade parece estar a ganhar espaço social na sua visualização, mas há uma coisa que está a minar por completo esse desafio vão: o assédio sexual em todas as esferas sociais, a começar pela escola, local de serviço, tanto no setor público como no privado, nos estágios profissionais (hospitais, empresas, escolas, etc.), no campo político (na política é moda o chefe envolver-se com uma menina “dama” ou “estrela”, como denominamos).

Chamamos a isso assédio sexual ou despromoção da própria mulher?! Efetivamente, a mulher pensa que só se valoriza se for apoiada pelo homem. Ou seja, para se afirmar como profissional, uma mulher precisa de ser ajudada pelo homem com fins à vista, envolvendo-se com ele. E se isso não acontecer, é algo a abater. Vingar-se da sua recusa, quer seja no campo político, quer seja no local de serviço. A promoção já era! Com efeito, o homem já tinha o seu propósito inicial: o de “conquistá-la”. Afinal, ser mulher nesta sociedade é sinónimo de não poder “andar com os próprios pés e pensar com a sua própria cabeça”, como sabiamente dizia Amílcar Cabral?

Já é hora de a mulher começar a assumir o seu papel na sociedade guineense. Aliás, não vejo (e continuo a não ver) a razão da mulher se orgulhar da conquista do espaço social, se ainda (e lamentavelmente) continua nos meandros dos homens “poderosos”. Será que valia a pena educar as nossas filhas para conquistarem o seu próprio espaço social? Ou melhor, valerá a pena continuarmos a gerar meninas nesta sociedade? Tenho medo. Tenho medo de dizer isso. Mas vale a pena eu dizer. E sabem porquê? Porque nesta sociedade as meninas devem ser educadas com o propósito de saberem que não existe “bom” homem que todo o mundo procura (na Guiné-Bissau, para se namorar ou para se casar), só porque esse tem recursos financeiros, carros de luxo, mansões, e consegue resolver qualquer assunto familiar da própria parceira. Se as mulheres procuram esse tipo de homens, inversamente, os homens de hoje também estão à procura da mesma coisa (mulheres com formação, bem resolvidas e com elegância). Importa frisar que os homens também são assediados pelas mulheres quando ocupam um alto cargo no serviço (Diretor-geral, diretor de serviço, etc.). Então, em que ficamos? E acima de tudo, vê-se uma menina, dita alfabetizada (certas meninas já formadas ou universitárias ou ainda a concluírem o ensino secundário) a envolver-se com um homem, só porque esse é emigrante, político (de saco vazio de ideias), pensando no seguinte: “ele consegue resolver os meus problemas financeiros, pessoais e/ou familiares”. Parece que o nosso sistema de ensino não está a formar cidadãs ativas e reflexivas. E o que diremos das que tiveram a oportunidade de receber formação/capacitação noutros países do mundo? Não sei se alguém consegue resolver qualquer que seja o problema, quando existe uma ideia esquecida de que lutando é que se conquista a sua própria dignidade, que é um valor impreterivelmente ensinado em diferentes confissões religiosas ou ainda nas sociedades onde imperam os valores ancestrais africanos (em todas as etnias da Guiné-Bissau). E o que dizer, então, da violência doméstica? Porque o homem continua a ser o centro das atenções. É ele que resolve todos os assuntos ligados à vida das meninas e mulheres. Quando é assim, não podemos esperar milagres do comportamento dos homens. Tem que haver participação ativa feminista nos desafios da ordem familiar e da ordem social.

Hoje em dia, existe uma luta ferrenha no denominado movimento feminista, defendendo direitos iguais entre homens e mulheres. Tudo indica que esse movimento ainda não se consolidou no nosso país. As nossas mulheres com formação académica que envolvem connosco, sendo colegas do serviço, só porque nós (homens) somos aparentemente mais competentes ou porque assim temos mais possibilidades de sermos promovidos a chefe. E quando essa última hipótese se consuma, elas (mulheres, em parte) pensam imediatamente que já garantiram o seu espaço entre colegas. Portanto, nós que pensamos exclusivamente em namorar as colegas de serviço; será que pensamos também nas futuras consequências laborais, quando tivermos a oportunidade de subir ao pódio? Sinceramente, acho que não pensamos nisso. As mulheres acabam por envolver connosco no local de serviço, porque achamos que somos superiores e donos do conhecimento, e não damos a oportunidades as mulheres e essas acabam por acreditar que para chegar ao topo é necessário ceder a nós (homens). A título exemplificativo, na sociedade política, para uma mulher alcançar um cargo (assumir funções) tanto nos partidos políticos como na formação de governos ou na parte administrativa, por exemplo, as diretorias gerais, de serviços, secretarias gerais, muitas vezes, é alvo de assédio sexual. Importa realçar que o assédio sexual também acontece nos homens, apesar de não ser tão recorrente como nas mulheres.

Portanto, nunca assumam nenhum homem, pensando no seguinte: “Olha, se eu recusar, vão-se-me fechar todas as portas”. Então, a quem não foi fechada a porta na Guiné-Bissau quando luta pelos seus direitos e os dos outros ou quando esse tem competências ou ainda quando luta contra todas as correntes do mal? Afirmativamente, não conheço. E penso que não existe nesta sociedade.

Se todos os homens pensam assim, apoiar/promover a mulher com a intenção de tirar proveito, através do assédio sexual, lamento dizer que vamos ter medo de educar as nossas filhas. Vamos controlá-las quando estiverem em atividades associativas, religiosas, desportivas, culturais, etc.? Porque essas nunca viverão noutro espaço, para além desse que “inventamos” e onde vivemos. As estatísticas sobre repetências e abandonos escolares precoces vão continuar a subir invariavelmente.

Queria colocar uma questão, nestas condições: vale a pena casarmos? Acho que a maioria vai pensar “Olha, acho que este tipo está a ficar maluco”. Maluco fiquei quando me pus a pensar neste assunto. Aliás, já deixei a minha opinião. Casar ou não casar é o assunto da nova ou da vossa discussão.

Uma mulher deve continuar a ser pedra angular na sociedade, seja qual for a sociedade. Ela deve valorizar-se e ter a certeza de que pode “inventar” o seu próprio espaço. Claro, na companhia do homem, como nos escritos do Génesis já nos deixaram evidências.

Termino a dizer o seguinte: a mulher tem condições de levar a vida que quiser, lutando sempre, sem esperar o “bom” homem, porque esse não existe. A título de exemplo, noutras sociedades, consideradas evoluídas (países nórdicos da Europa, mais desenvolvidos do ponto de vista do índice do desenvolvimento humano, incluindo saúde e educação), as mulheres é que dirigem a vida familiar e dos próprios países. Basta de o pensamento pobre de que só os homens é que podem mandar e dirigir a vida na sociedade. Eduquemos as vossas filhas com a ideia iluminada e de luta titânica entre meninos e meninas, e essa revolução pode começar na família, na escola (em todas as tarefas pedagógicas, proporcionando esse desafio de igualdade de oportunidades) e na comunidade. Nas minhas aulas, não existe: “professor, não posso, não sei, não sou capaz”. Afinal, quem pode, quem sabe e quem é capaz? Todos nós podemos, sabemos e somos capazes de realizar/cumprir qualquer desafio social ou académico. As vítimas do assédio sexual, muitas vezes, têm medo de denunciar as práticas nos serviços junto das entidades competentes ou não têm conhecimentos de como e onde fazer esta denúncia para desencorajar este tipo de práticas recorrentes praticamente em todas esferas sociais.

Lisboa, 13 de maio de 2022

Prof. Luís Blak

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